Obrigada moça desconhecida.
Renata escreve esporadicamente por aqui, e com mais frequência no Instagram @mindfulness_descomplicado.
Terá sido tão de repente assim? Desaceleramos muito com a proximidade dos 40. Aprendemos a caminhar apreciando o caminho ao invés de correr loucamente para chegar sabe-se lá onde. Descobrimos que todas queremos chegar lá, e que o lá de cada uma é diferente. Aprendemos a olhar de dentro para fora. Muita coisa aconteceu nesta década. Crianças nasceram, animais de estimação se foram, relações se fortaleceram, outras, desvaneceram. Aprendemos muito. Principalmente que dividir só nos faz melhores.
Obrigada moça desconhecida.
Renata escreve esporadicamente por aqui, e com mais frequência no Instagram @mindfulness_descomplicado.
Uma das minhas metas para esse ano é levar uma vida mais leve. Eu sei, você deve estar se perguntando, o que é uma vida mais leve?
Creio que não haja consenso, mas eu tenho claro o que isso quer dizer. Enfim, meta definida, está inclusive no meu lema do ano.
Mas eis que o universo, com seu jeitinho todo malandro, fez uma livre interpretação dessa meta e comecei o ano retirando o apêndice. Um órgão vestigial, não faz diferença em termos de peso, mas é um órgão a menos né?
Brincadeiras à parte, a cirurgia foi de urgência e agora já está tudo certo. Passei 4 dias com dor, uma dor que alguns dizem que é insuportável, e eu achava que era cólica menstrual. Vocês têm noção disso?!
Depois da cirurgia, ouvi alguns relatos similares, de que algumas mulheres ficaram com dor tempo demais, se colocando em risco, por achar que tinham que aguentar ou por achar que sua queixa não seria levada a sério. Isso me chocou demais, não apenas porque eu também fiz isso e cheguei a um estágio bem grave, quanto por saber o quanto é recorrente.
Mulheres, se cuidem. Pessoas que convivem com mulheres, insistam para que busquem atendimento.
2024 começou animado por aqui, e seguimos problematizando. Afinal, eu quero uma vida leve, mas não superficial.
Renata escreve por aqui esporadicamente, há anos.
E vem percebendo os ciclos da vida cada vez com mais clareza.
Hoje, para mim, ela vem da permissão de me abrir para receber.
Da disponibilidade em crescer interdependentemente e em comunhão.
De olhar para meu sentir.
Da humildade em olhar para mim, para minha história, meus hábitos, atos, comportamentos que não fazem mais sentido para o que desejo viver.
De me libertar de velhos padrões.
De quebrar velhos ciclos ancestrais, honrando-os, mas escolhendo fazer diferente e seguir por novos caminhos.
De me conectar com meu coração, com meu corpo, perceber o mundo.
De mergulhar em mim, no meu mundo intuitivo, no meu espaço sagrado.
De me preencher inteira de pai e de mãe, tomar de canudinho e me lambuzar inteira com essa vida que me foi dada de presente por Deus, através deles.
Vem da força do silêncio, da força de gerar vida, da força de colorir a vida em preto e branco.
De conseguir comunicar de forma vulnerável e permissiva: necessidades, desejos, sentimentos e problemas.
Hoje , para mim, a minha força vem da minha capacidade em pedir ajuda, e não de fingir que eu não preciso de ninguém e de que dou conta de tudo sozinha.
De me abrir para receber do outro e da vida.
De não mais emburrar e fechar meu coração, mas ter a maturidade de conseguir lidar com meus problemas relacionais e virar a grande chave de não me manter mais como vítima inocente diante deles. Entender que às vezes preciso “sujar minhas mãos” e sair da inocência ou abrir mão da razão, para estar nas relações.
De também me responsabilizar pelos meus atos e ter humildade e clareza para dar os passos necessários para compensa-los.
Por muito tempo eu acreditei que minha força estava dentro de armaduras: da super mulher, da Mulher-Maravilha e guerreira, com minhas bandeiras erguidas e armas em punho.
Hoje sei que minha força habita onde há beleza, leveza, onde há lastro emocional sustentado.
A minha força hoje habita na minha capacidade de ser feliz, de ser leve e fluir e estar presente no AQUI AGORA da vida.
Para mim, esse tem sido o verdadeiro segredo do feminino, minha verdadeira força de mulher.
Gabriela Lima, mulher, amazônida, aos 41 anos se (re)descobrindo mulher.
Vocês já sabem que eu sou fã de clichês. Eles existem por uma razão e são muito, mas muito úteis. Então, vamos ao clichê anual de fazer uma retrospectiva do ano que passou e do quanto aprendemos com ele.
Mas vocês também sabem que sou bem objetiva, e o que aprendi com esse ano foi: sou resiliente pra caramba. Spoiler dado, vamos aos fatos e vocês (espero) irão concordar comigo.
“Gabriela… sempre Gabriela… eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim..” Será?! Me conhecendo como hoje me conheço, nesses 41 bons anos, sei que definitivamente não tenho a chamada “síndrome da Gabriela”.
Eu mudei. Não vou dizer que sou uma “Metamorfose Ambulante”, porque minha própria metamorfose me fez gostar da estabilidade e da calmaria. Para sempre será assim? Só o velho tempo poderá dizer.
A ideia de me reapresentar surgiu a partir de reencontros com amigos, primos e conhecidos que falam: “nossa, como você mudou”. Então de repente você está chegando agora. Ou me conhece de outros carnavais. Permita-me.
Decidi reescrever uma auto descrição que fiz há 10 anos, para o blog de (hoje amigas) balzacas, o “De repente 30” que já virou “De repente 30, 40” e está prestes a incluir o 50!
E se você ainda não percebeu, os meus textões aqui denunciam: há uma escritora que habita em mim.
Então hoje, aos 41, posso dizer:
Sou tudo que li, vi, ouvi e vivi. Tudo que experienciei nessa vida. Cada sorriso, cada deserto, cada renascimento, cada cicatriz e cada libertação.
Acreana do “pé rachado”. A sede de me jogar enlouquecidamente no mundo deu lugar a estar em paz com minhas raizes. Aceitando o meu lugar dentro de mim. Claro que ainda quero conhecer uma parte do mundo. Mas não tenho mais pressa. E antes disso, ainda quero dar um mergulho nos rios e florestas que meus ancestrais ajudaram a desbravar.
Aprendi também que na vida de adulto, a gente precisa perder para ganhar. As escolhas nos tornam quem vamos sendo. A gente só precisa banca-las e não olhar com remorso para trás. Faz parte da autorresponsabilidade.
Ariana de sol e lua. Ascendente em gêmeos (comunicadora nata!), mas com Mercúrio em peixes, que traz profundidade, emoção e subjetividade nas palavras ( e muitos atrapalhos!!). Um Marte em libra que me ajuda a ser diplomática. Então não sou a típica ariana explosiva, mas às vezes “briguentinha” (com classe) e tenho meu lado chatilda também (pra quê eu vou mentir!? Haha).
Aliás, pouco a pouco vou me livrando da máscara da certinha-boazinha-perfeita. Aprendi com o tempo a dizer não, antes com mais culpa que hoje. O exercício de limites tem sido lindo! Ainda me exijo e cobro mais do que deveria, mas bemmm menos do que antes. A terapia anda em dia também pra isso.
Já me julguei “empoderada”, uma fachada que hoje sei que só escondia o tamanho das minhas feridas e traumas. A forte por fora, mas tão frágil e carente por dentro.. A dita corajosa, mas no fundo tão medrosa. Um medo de me jogar de verdade como adulta no jogo da vida. Eu brincava de me relacionar.
Declarei muita guerra aos homens, ou por acha-los “maus”, ou por acha-los inferiores, ou por acha-los desnecessários. E quando eu passei a mergulhar no meu poder real, de estar no meu lugar (primeiro de filha, segundo de mulher), uma chave profunda virou dentro de mim. Mergulhei nesse mundo de magia, poesia e leveza do feminino, aprendi a receber da vida e do outro. Aprendi a pedir ajuda, a me vulnerabilizar, a me conectar com meu corpo e meu sentir e sair um pouco do “cabeção” (ainda em processo!). Aprendi o movimento de colocar as setas para mim, a cuidar do meu jardim e me amar. Nem preciso dizer que minha relação com o masculino acabou também mudando profundamente nesse processo. Um processo de quase dois anos de estudo. Mas esse assunto e descobertas podem ser tema de um outro texto.
As lista sem fim de amizades deu lugar aos amigos que se contam nos dedos. Ainda adoro me relacionar, trocar ideias, experiências, aprendizados, carinhos e afetos. Mas tenho aprendido a ser mais criteriosa com as pessoas e espaços que acompanham de perto minha intimidade e minha vida.
Sempre me disseram corajosa (ou doida!), por largar por um tempo os meus empregos públicos, para viver só de empreender. Fracassei, senti vergonha, recalculei a rota. Voltei, ressignifiquei, entendi onde errei e não desisti. Eu sou uma intraempreendedora, não posso negar. Faço isso quanto posso no serviço público.
Aliás, eu amo trabalhar e gosto de trabalhar por produção. Não sou boa com burocracias, mas sou boa em executar, criar, fazer.
Gosto tanto de trabalhar, que se me empolgo, posso adoecer (workaholic em recuperação). Então, ao longo dos anos e Bornouts, aprendi a me respeitar e aprender sobre meus limites.
Hoje o meu maior valor é o de QUALIDADE DE VIDA. Não tem nada na frente disso, além de Deus. Porque entendi na marra que se eu não estiver bem, as pessoas ao meu redor tbm não ficam, meu trabalho não acontece. Essa lição levou anos e anos para ser assimilada.
No campo profissional, me considero fora da caixa. Vejo conexões onde nem todos veem. Fui me especializando na área da educação, na área do desenvolvimento humano e da saúde mental. Me formei em Fonoaudiologia, mas me considero uma profissional da saúde. E da comunicação e do desenvolvimento de pessoas. Adoro os dispositivos de roda, lugar em que posso aprender e servir em espaços coletivos com impactos no individual. Isso me brilha os olhos. Ahhh e amo comunicação, assim como amo música, por isso apresentar um programa de rádio no sistema público me contempla em diversos sentidos.
Continuo sendo curiosa e sonhadora. Não sofro mais de otimismo crônico, a maturidade me trouxe mais pé no chão. Mas continuo tendo uma profunda fé no universo. E nas pessoas. Gosto de gente, da troca. Mesmo sabendo que ninguém é perfeito, tampouco eu. Aliás, o maior aprendizado pra mim foi ABSORVER que não sou perfeita, e assim aceitar mais as falhas alheias. Meu Deus, como isso liberta. Poder dizer “tem algo contra mim? Pois fica contigo, não precisa me dizer não!” Hahaha. Vi isso num vídeo e levei para a vida. Fale o que quiser, pense o que quiser. No final, quem sabe de mim, sou eu.
Eu continuo achando que casar e comprar uma bicicleta seja possível. Falando nisso, nunca disse tão claramente e abertamente: meu maior sonho é casar e construir uma família!!! Sempre foi no fundo, mas por tanto tempo me enganei, focando na carreira, cursos e mestrados da vida. Em festas, viagens, amigos que não eram tão amigos, relações fadadas ao fracasso. Tudo valeu a pena, foi importante. Talvez teria feito menos, bem menos.
No mais, continuo amando cinema (muito), cozinhar ouvindo música em volume máximo (com uma taça na mão dependendo da ocasião).
Dançar continua sendo um exercício de libertação; escrever, um aprendizado constante. Amo viajar (quero ficar rica pra isso! Hahaha). Adoro dias de sol e também banhos de chuva. Gosto (hoje) de cachorro (muito).
Acredito em Deus, e em outros tantos seres iluminados. E escolhi Jesus para ser meu guia (me batizei como cristã no ano passado), já que todos os meus caminhos espirituais sempre acabavam me levando até Ele. E filha de pais Marianos, sigo rezando também por sua Mãe … Nossa Senhora que também cuida do meu coração ❤️
E no fim, continuo aprendendo, sempre.
Gabriela volta a escrever aqui depois de anos. Vai precisar resumir esse texto pra poder atualizar a sua bio do blog. Não sabe quando aparece de novo, mas se sente feliz, por criar ânimo de voltar por aqui .
Depois de uma vida inteira baseada na certeza de que não só eu não gostava, eu era fisiologicamente incapaz de engolir cuscuz, descobri que: pasmem! Eu gosto de cuscuz.
Gosto de cuscuz doce, gostoso de cuscuz com um pouquinho de sal. Gosto de cuscuz com leite de côco.
Essa descoberta aconteceu durante a travessia do Vale do Pati, na Chapada Diamantina, que fiz esse ano (2022 para a posteridade). Foram cinco dias caminhando, superando limites físicos, mentais e espirituais, com muito contato com a natureza e com pessoas incríveis. Onde os banhos de cachoeiras eram como estar novamente no útero. O útero de gaia, literalmente
As noites eram ao redor da fogueira vendo a via láctea e ir dormir às 20:30 era socialmente aceito, assim como passar o dia de roupa molhada e cheia de barro.
E o café da manhã...ah, o café da manhã era um dos pontos altos dessa rotina. E todos os dias eu comi: cuscuz. Comi com apetite e prazer. Comi como quem degusta a história e o aroma a cada bocado.
Fiquei tão animada que comprei uma cuscuzeira pequena (vermelha e linda, que já chamei de Ilda) e vou incorporar essa comida na minha rotina. Talvez querendo trazer um pouco do gosto da natureza pra casa.
Depois disso, minha filha me mostrou o podcast “Só ouço falar” e ouvimos juntas o episódio da laranja (https://open.spotify.com/episode/3Gl1H7CGW7LZ48gNm4Suik?si=03e6d7e0e44d4fad), que de uma forma engraçada e leve conta uma experiência semelhante à minha do cuscuz mas, como você já deduziu, com uma laranja.
Foi um momento: uau! Percebi que o cuscuz era a minha laranja, ou seja, era aquela decisão que tomamos (ou que foi tomada por nós) há muito tempo sobre o que gostamos e do que não gostamos, e que nem questionamos. Vivemos com essas certezas do que é bom e do que é ruim. Do que gostamos, fazemos, podemos, queremos e do que não. E quanta coisa deixamos de provar e viver por causa disso... Quanto nossa vida poderia ser muito mais rica (ou divertida) se a gente não acreditasse piamente nessas crenças que vêm sabe-se lá de onde.
Renata está certa de ainda há várias laranjas nesse mundo e está animada para olhar para isso. Quem sabe você também possa olhar e descobrir novos sabores, gostos, sensações. Afinal, a vida é cheia de laranja. E cuscuz.
Meditação
O que vem na sua mente ao ler essa palavra?
Essa é mais uma daquelas palavras que chegam carregadas de
significados, que podem ser diferentes para cada pessoa, mas que em geral não deixam
espaço para novas percepções.
Esse texto é um relato da minha experiência com meditação, e
pode ser que te incentive a ter uma curiosidade para entender o que meditar
pode significar, a partir da sua própria experiência.
Fui criada em uma família católica, e frequentar missas e
grupos de oração era parte da minha rotina, sem questionamentos. Eu gostava
dessa vibe de pessoas reunidas com objetivos mais elevados. Até que fui
percebendo que não era bem assim, e fui aos poucos me desiludindo e me
afastando. Como herança dessa época, ficaram resquícios de alguns preconceitos
e a falta de hábito de buscar outras formas de enxergar o autodesenvolvimento.
Águas passadas, cheguei em uma fase da vida (que imagino que
seja muito comum) em que estava tão estressada que não dormia, não me
concentrava e me sentia oprimida pela quantidade aparentemente desumana de
demandas para resolver. Nessa época, caiu nas minhas mãos um livro que foi um divisor
de águas: Para Viver em Paz - O Milagre da Mente Alerta, do fofo monge Thich
Nhat Hanh. Por mais que eu tente, não lembro como ele veio parar na minha vida
(se o anjo que me indicou esse livro estiver lendo o texto, me fala!). Tenho
esse livro até hoje, rabiscado e meio manchado, e é um dos poucos livros que
faço questão de carregar em todas as mudanças.
É um livro pequeno, simples. E que abriu as portas para uma percepção de que viver melhor não só é possível, como é fácil.
Juro.
Nessa época eu estava tão estressada que atos simples como
lavar a louça eram quase uma tortura. A cabeça pensando nas milhares de coisas
a serem feitas, o corpo preso em uma atividade necessária, mas que parecia tão
inútil, gastando tempo precioso que podia estar sendo usado para tantas coisas
que eu não conseguia nem enumerar. Uma luta entre o presente e o futuro, e o
passado dando pitacos e gerando culpa... era um pesadelo. Seguindo os conselhos
do livro, me propus a fazer um exercício buscando manter a mente no presente, a
tal da mente alerta que o livro menciona já no título. O exercício era simples:
ao lavar a louça, lave a louça. Quem já sentiu ansiedade já percebeu que isso
pode ser bastante desafiador. Se tem algo que eu sou, é dedicada, e eu me
dediquei a essa atividade. Olhei no relógio antes de começar a lavar a louça, e
ao lavar cada prato, cada copo e cada talher, eu falava em voz alta: estou
lavando o prato; estou enxaguando o prato, estou sentindo a água nas mãos,
estou percebendo a espuma escorrer com a água. Optei por falar em voz alta
porque minha mente estava tão barulhenta que eu não conseguia apenas pensar. Mesmo
me sentindo boba, segui o exercício até terminar de lavar a louça. Quando acabei,
olhei novamente no relógio. Cinco minutos tinham se passado. Se me perguntassem
quando tempo eu levava em média para lavar a louça, eu teria dito sem titubear:
pelo menos 20 minutos perdidos da minha vida! (sim, ainda rolava um drama para
piorar a situação).
Percebi que levei apenas 5 minutos para fazer uma atividade
necessária, sem me desgastar com a ansiedade de coisas que não podiam ser
resolvidas enquanto eu lavava a louça, com bônus de não ter quebrado nada
(que já estava virando rotina) e de perceber que a mente tinha descansado um
pouco...ufa. Enquanto eu lavava a louça, eu estava lavando a louça. Simples assim.
Isso foi revolucionário na minha vida!
O livro não é sobre lavar a louça, mas sobre como viver em
paz. E o caminho é a presença, é a compaixão, é escolher viver dessa forma. No
mundo em que vivemos, com tanta pressa e tanta demanda, pode parecer desafiador,
mas é possível. E um caminho é a prática da meditação. Ela é acessível a tod@s, e a sua prática traz
benefícios em diversos aspectos da vida. Apesar de sua influência budista, as práticas são laicas, não é
necessário ser budista para meditar.
Depois desse episódio, me tornei mais e mais interessada em
meditação, passei a me tornar mais consciente, mais
compassiva e sim, a viver melhor. Isso quer dizer que eu não me irrito e que
medito o tempo todo? Não. Continuo humana, sentindo, errando, aprendendo, e
continuo meditando, estudando e acreditando que é possível viver em paz.
Renata escreve aqui esporadicamente, há anos, e um dos seus
desejos para 2022 é uma vida melhor e com paz para tod@s. Ela acredita que a
prática da meditação é um caminho para isso.
O ano é 2034, estamos em janeiro e faz 45°C (o aquecimento global tem causado grandes estragos no mundo).
Sento-me com minha sobrinha, que está prestes a completar 15 primaveras e resolvo falar sobre como era o mundo no ano em que ela nasceu: 2019.
Nostalgicamente, digo a ela que íamos à lugares sem máscara e que havia festas, naquela época.
Ela pede, com a mesma carinha que fazia na infância, "mostra uma foto, dinda"? e eu mostro as muitas fotos que mandei revelar em 2021, um ano depois da pandemia ter começado. Ela olha todas elas e vejo seus lindos olhos verdes brilharem.
Então ela se atém a uma foto específica:
"Você está tão linda nesta, dinda. Parece tão feliz". É, eu costumava ser bem feliz. Ia aos lugares que queria, saía para ouvir música e tomar um chopp, organizava as festas da família, incluindo as da minha filha, é claro.
Teodora está no 1° ano de faculdade. A escolha do curso foi óbvia: escolheu o que é possível fazer, embora na infância sonhasse em ser atleta. Ficou complicado no mundo das máscaras e ela acabou desistindo. Teve sua vida escolar reduzida ao mundo online, as sucessivas pandemias desde o coronavírus impediram que pudesse viver a escola como no meu tempo: espaço e presença físicos.
Que saudades da escola! Nos aglomerávamos nos corredores, esperando os professores chegarem. Mais tarde, quando fui professora, meus alunos faziam o mesmo. Mas isso foi antes de 2020. Parece que foi em outra vida.
Acordo subitamente, corpo encharcado de suor. Demoro um pouco para me situar. Ainda estou em 2021, em meio a uma pandemia. Faço uma prece e agradeço a Deus: a possibilidade de repetir que "vai passar" não nos foi tirada.
Andri escreve às sextas-feiras e acordou, no meio desta semana, após ter um sonho onde essa história acontecia. Dedica para Mariah (sua sobrinha) e Teodora, sua filha, que vão poder viver todas as coisas que ela mesma viveu na sua infância e juventude, porque as palavras têm poder: "Vai passar".
Sentou na única poltrona da
casa em que não costumava sentar. Pensou que, mudando de perspectiva, poderia
mudar também tudo o que não estava bom na sua vida.
Dias antes, havia se dado
conta de que logo vai completar um ano de home office. O que até pouco tempo
atrás não estava mais incomodando, começou a gritar dentro dela.
Por um longo tempo, foi bom
curtir o lar, mas agora, parece que o ar está ficando escasso e não há outro
modo de recuperar o fôlego, senão saindo para o mundo lá fora. Só que esta
possibilidade não se aplica no momento. Lá fora, bandeira preta em todo o
Estado. A pandemia voltou a ganhar força.
Pouco mais de um mês atrás
iniciaram as vacinas no Rio Grande do Sul e a esperança tomou conta de boa
parte das pessoas, incluindo ela.
“Onde foi que nós erramos”?-
indaga a si mesma enquanto lembra que colocou algo no forno e esqueceu de
monitorar o tempo. Nos seus devaneios já começa a filosofar sobre o tempo, o
que ele realmente significa, senão uma medida socialmente convencionada a fim
de nos manter ocupados.
Sente falta dos dias cheios,
em que chegava em casa exausta e se atirava no sofá, antes de dar conta de
todas as tarefas que ainda a aguardavam em casa. Sente falta da sensação de
“normalidade” de uma vida pautada pelo livre arbítrio. Entende a circunstância
da pandemia, compreende a necessidade de “ficar em casa”, mas não consegue
deixar de pensar que, em algum momento, as pessoas seguiram com suas vidas,
adaptando-se à nova rotina.
No seu íntimo, a única
pergunta que persiste é “até quando”?
Andri
pretende voltar a escrever nas sextas-feiras, porque o caos que habita seu
íntimo precisa sair de dentro dela.
“Eu tinha que esperar mais de 20 dias dentro do barco. Havia meses em que eu ansiava por chegar ao porto e desfrutar da primavera em terra. Houve uma epidemia. No Porto Abril nos proibiram de descer. Os primeiros dias foram duros. Me sentia como vocês. Logo comecei a confrontar aquelas imposições utilizando a lógica. Sabia que depois de 21 dias deste comportamento se cria um hábito, e em vez de me lamentar e criar hábitos desastrosos, comecei a comportar-me de maneira diferente de todos os demais. (...)Em vez de pensar em tudo que não podia fazer, pensava no que faria uma vez chegado à terra firme. Visualizava as cenas de cada dia, as vivia intensamente e gozava da espera. Tudo o que podemos obter em seguida não é interessante. Nunca. A espera serve para sublimar o desejo e torná-lo mais poderoso. (...)Naquele ano me privaram da primavera, e de muitas coisas mais, mas eu, mesmo assim, floresci, levei a primavera dentro de mim, e ninguém nunca mais pode tirá-la de mim.”(*)
Sou uma pessoa conhecida pela minha falta de memória com datas. Confundo-me com momentos; nunca sei ao certo onde e quando ocorreram. Mas guardo com cuidado, e em ricos detalhes, todos os sentimentos que tais momentos me proporcionaram.
O dia 18 de março de 2020 certamente será diferente. Estou certa de que guardarei esta data na memória como o dia em que perdi minha liberdade. Mais precisamente como o dia em que renunciei à minha liberdade, pensando em todos aqueles que não a possuem sequer para, momentaneamente, dela também renunciarem.
Somos gregários. E eu me sinto ainda mais gregária que muitos. Também sou conhecida por viver em festa, cercada de pessoas de todas as raças, credos e cores, conversas acaloradas ao redor da mesa, ao tilintar de copos que se esvaziam rapidamente, gargalhadas escandalosas e obscenas, braços dados e abraços apertados no meio da rua. Sofro. Já não sei se serei lembrada assim. Ou talvez o seja, porém com data para acabar: 18 de março de 2020. Passados nove meses e dez dias, confesso que nutro meu espírito, algumas vezes de decepção, outras de esperança. Não sabemos quando isso irá acabar, nem se irá acabar.
Em 18 de março de 2020 eu ainda tinha esperanças de comemorar meu aniversário, pouco mais de dois meses depois, com festa. Um grande encontro de amigos. Eu ainda não estava abatida, consegui comemorar remotamente e, confesso, naquele dia pareceu-me extremamente divertido. Mas não consigo mais viver um momento tão crítico alegremente. Não consigo mais deixar de sentir repulsa por quem nega a existência do perigo e relaxa com a vida alheia. São mais de 190 mil famílias chorando no país. Sem contar aqueles que choram em solidariedade, mesmo que (talvez, ainda) não tenham perdido um ente querido.
Tenho a impressão de que nem a proximidade da morte foi capaz de fazer com que grande parte das pessoas refletisse a respeito do que realmente importa. Incontáveis pessoas ao meu redor não foram capazes de renunciar ao direito de ir e vir em prol da vida, em prol do outro. As mesmas pessoas que enchem igrejas e templos, que pregam amor ao próximo. Venho tentando oferecer a outra face, mas está cada vez mais difícil.
Do meu recolhimento, ouço o alvoroço de crianças brincando, gargalhadas de adultos e penso que nunca imaginaria que sons outrora tão alegres e convidativos um dia me causariam um misto de vergonha, horror, náusea, decepção. E saudades, muitas saudades da época em que a preocupação com o outro me parecia mais etérea (embora não devesse jamais).
Às vezes penso que morri um pouco. Às vezes penso que há muita vida à minha volta e à minha frente. Às vezes penso que meus sonhos estão cada vez mais distantes da concretude. Outras, sinto que é apenas uma questão de tempo até eu voltar a alçar vôos cada vez mais distantes.
O desespero eu aguento. O que me apavora mais é a esperança. Não sei ao certo quem disse isto, dizem que o Millôr Fernandes. É exatamente o que sinto neste momento. Uma esperança apavorante. Porque em 2020 eu sinto que morri um pouco, mas em 2021 eu não vou morrer de novo.
Laeticia tem esperanças em um futuro melhor. Quando este dia chegar, vai botar seu bloco na rua.
Esta postagem possui trilha sonora!!
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(*) Gabriel García Marques em O Amor nos Tempos do Cólera.