sábado, 12 de abril de 2008

Ê tranqueira

Doutor:

- A senhora tem que entender que este é um problema que atinge essencialmente as mulheres. Não necessariamente é uma disfunção fisiológica, mas sim funcional. Está tudo bem com o seu intestino, é apenas o seu cérebro que está ocupado demais com outras coisas para dar o comando para que ele funcione. É normal evacuar apenas duas ou três vezes por semana. Você tem que se liberar para poder liberar.

Paciente (a resposta que ela pensa em silêncio):

- É sim, toda a vida nós fomos tão come-e-caga (quá-quá) quanto o senhor e qualquer exemplar “liberado” do sexo masculino. “Efeito sifão” como ainda ontem eu ouvi, e morri de rir. Daí, de um dia para o outro somos mulheres adultas e responsáveis. Liberar? Eu me liberava sim, quando andava vestida de grunge e se arrotasse na rua é quase certo que quem estivesse comigo ia achar lindo! Agora, pergunte pra qualquer mulher que fique quase dez horas por dia em um lugar com um banheiro glacial, que nada tem do aconchego no lar, muito menos o nome dela escrito na toalhinha ao lado da pia, se alguma vez ela ouviu um sonoro peido, ou mesmo sequer pensou na possibilidade de produzi-lo em tal lugar (o que sem dúvida é comum e corriqueiro na “casinha” ao lado, ou seja, a sua, porque inclusive nós costumamos escutar seus diálogos gasosos)? Duvido, mas duvido mesmo! Imagina se bem na hora adentra o recinto justo aquela pessoa que não vai mesmo com a sua cara e passa praticamente a te conhecer por dentro em um instante?

Liberar? Há é muito fácil mesmo, quando é muito comum estarmos dilaceradas, arrasadas porque fomos, por algum motivo, menosprezadas pelo chefe e ele nem percebeu, escanteadas pela equipe que nem sentiu a nossa falta, fizemos muita hora-extra e vamos ter que pagar de imposto mais do que recebemos de grana, pegamos de relance a bisca impecável daquela reunião observando nossas unhas caóticas, nossa mãe está doente, ou triste e com saudade e nós não estamos lá, nossas pernas estão peludas e há dias nosso corpo moído não consegue fazer com o amorzinho tudo o que nossa mente queria, e ainda perdemos um amigo porque afinal nem temos mais tempo para os amigos, há meses não falamos com nossa avó e não vemos nossos irmãos, o DVD nos espera na assistência técnica porque ainda não juntamos forças pra xingar o tanto que achamos que eles merecem, nossas finanças esperam ser organizadas mas continuam um caos, continuamos sem ganhar dinheiro investindo na bolsa de valores porque não temos tempo para pensar nisso, as blusas que compramos um pouquinho maior porque estavam na promoção continuam lá, com etiqueta, na sacola e esperando para irem para a costureira, e ainda por cima temos uma pilha de roupas para lavar antes das oito da noite pra não acordar o bebê do vizinho com a escola de samba que se instala na área de serviço (isso para quem não tem filhos, pois as que têm o senhor veria pelo menos por mais uns dois dias sentadas nesta cadeira olhando para o senhor e pensando no resto da lista com esta mesminha cara de paisagem que o senhor vê agora). Tudo isso sorrindo e com o salto esmagando o joanete, mas de salto, é claro! Queria ver o senhor sem ir aos pés* e enfezadíssimo há três dias, se ia achar normal!

Paciente (a resposta que ela realmente dá):

- É claro, doutor, eu entendo! Liberar...

* ir aos pés: expressão gaúcha para “pagar um barro”, “sujar a louça”, fazer um “número 2” ou um “download”, etc., a qual eu educadamente utilizei com meu doutor de São Paulo e tive que vê-lo engolindo a risada e perguntando “o que mesmo você disse?”. Grrrrrrr!!!! Liberar, liberar...

Gisele Lins escreve aqui aos sábados. Às vezes bem liberada, mas muitas outras não!

2 comentários:

Angel disse...

Durante a semana eu também não libero com facilidade. Não há nada como um recinto aconchegante, com a sua cara, para liberar sem grilo ou preocupação de algum colega ou chefe pensar que você está dormindo no WC...kkk

Beijos!

Renata disse...

Hehe!!
Depois de vááárias tentativas de mudar dieta, exercício, beber água o dia inteirinho...Sabe o que resolveu: terminar com o namorado! Pois é! Não é sugestão, não, mas é que no meu caso o constipamento emocional era maior ainda que o físico,e trancava tudo!!
Não desista! Hehe! Bjs!!

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