sexta-feira, 7 de maio de 2010

Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo

Não, este não é mais um post sobre cinema. Mas o título do filme do Karim Ainouz e do Marcelo Gomes tem a ver demais comigo. Não deu pra deixar passar batido.

Acho que nunca comentei aqui, mas o grande sonho da minha vida é viajar. Desde criança carrego isto em mim. Um dia, eu estava no ortodontista, devia ter aí uns 10 anos e ele me perguntou o que eu queria ser quando crescesse. Respondi que queria ser aeromoça e ele questionou porquê. A resposta foi rápida: pra poder conhecer o mundo todo!! Aos dez anos eu já sabia que viajar pelo mundo não ia ser barato. Mas eu achava que não seria barato em termos financeiros. Também é, mas o custo maior não é este.

Meu ortodontista me disse, naquele dia, que eu não precisava ser aeromoça pra conhecer o mundo, e eu acreditei. Esta vontade louca de conhecer países, povos, culturas diferentes ficou latente em mim até o dia em que tive oportunidade de fazer intercâmbio. Aquele ano tinha despertado novamente em mim a vontade de conhecer o mundo. Era uma vontade pueril que eu tinha, sabem, até então eu mantinha meu sonho no plano dos sonhos intangíveis, mas o intercâmbio me fez acreditar que conhecer o mundo era um sonho possível.

Quem viaja muito não pode ser muito apegado a nada. E eu tentei me desapegar. É difícil, muito difícil. E há inúmeras outras dificuldades no caminho. Algumas financeiras, mas a maioria de cunho pessoal. Eu tinha que estudar, oras. Só aí foram-se cinco anos sem por os pés fora do país. Ou eu pagava minha faculdade, ou viajava. Pra mim não havia alternativa: tinha que estudar. Sair de mochila pelo mundo naquele tempo já me parecia uma coisa meio maluca. Fora que minha mãe ia me matar!

Quando me formei, já namorava meu marido. Ele dizia que queria viajar muito também. Nós já havíamos viajado juntos, mas nunca pra fora do país. Mas era uma questão de tempo; a gente ainda ia viajar muito, mas muito mesmo mundo afora. E como a idéia era viajar, viajar, viajar, filhos nunca couberam em nossos planos. Até porque em mim o tal instinto maternal até hoje não se manifestou e fico feliz por isto. Ter filhos, nas atuais circunstâncias, seria uma irresponsabilidade, uma temeridade, penso eu. Ainda não fiz nenhuma das viagens com as quais sonhei. E não estou disposta a abrir mão do meu maior sonho por nada que me prenda, que exija ser prioridade.

O tempo passou, desde que o sonho de conhecer o mundo se estabeleceu passaram-se muitos anos e nenhuma viagem foi feita. Aos poucos, fui inventando desculpas pra adiar minhas viagens, como se fosse razoável deixar de perseguir coisas tão importantes, tão cheias de significado na nossa vida. Mas eu fiz isto. Coloquei na frente dos meus sonhos verdadeiros estudos, casamento, mais estudo, sonhos lindos, porém rasos, de ser uma grande advogada criminalista e escrever manuais de Direito Penal. Nunca quis nada disso... O que eu queria mesmo era viajar. Tudo girava em torno disso. Mas estranhamente nunca mais consegui sair do Brasil. Várias viagens planejadas e sempre acontecia alguma coisa que me impedia de dar início à minha jornada. Incompreensível. Parecia que o mundo não queria se mostrar pra mim e me mantinha presa em raízes que eu sequer tinha!!

Custei a perceber que estas raízes que me prendem não são minhas! Eu acabei virando uma espécie de personagem de mim mesma. E as raízes são deste meu outro lado, o que eu gosto menos. A versão conservadora de mim não me agrada. Não digo conservadora no sentido pejorativo. Mas sim no sentido de que faz parte da vida estudar, trabalhar no que se estudou, casar, juntar dinheiro pra comprar uma casa, trocar de carro de tempos em tempos e viajar nas férias, se der e quando der. Este personagem conservador gosta de se sentir bonito, seguro, ter coisas que sabe bem não valerem nada de verdade. Este personagem, ou um lado meu, ainda que eu goste menos dele, tem vestidos, jóias, sapatos, bolsas, maqueia-se, sai bem na foto.

Mas o meu outro lado, o mais escondido, que pouquíssimas pessoas conhecem, quer mesmo é cair na estrada. Quer se desfazer de quase tudo que acumulou, guardar apenas fotos, lembranças de momentos importantes, quem sabe as jóias, que ocupam pouco espaço, porque todas ganhadas de pessoas muito amadas e que me amam – ou amaram um dia – muito. Meu lado mais discreto, que quase nunca se mostra, anda querendo mais espaço. Anda querendo romper com este conservadorismo que o prende como grilhões. Meu lado mais visível tem a vida que todo mundo pediu a Deus: família, amigos, trabalho, oportunidades. E é justamente isto que dá forças a ele pra sufocar o lado tímido, que vinha se escondendo cada vez mais.

Ultimamente tenho me lembrado muito de um livro que li a primeira vez há tantos e tantos anos: A Menina e O Pássaro Encantado. E me sentido muito Pássaro Encantado... Não me entendam mal, meu marido não me prende. Ele não me impede de fazer nada. Quem faz isto comigo sou eu mesma. Não, não fui à Turquia. Nem à Tailândia. Faltou dinheiro? Sim, mas também faltou coragem. Algo me impediu de fazer isto. Medo. Medo de depois precisar e não ter, de correr atrás e não dar certo, apesar do meu esforço. Mas e seu marido? Não podia ajudar? Sim, podia, mas este não é o sonho dele. É o meu sonho. E pra que nossos sonhos se realizem, precisamos ir em busca dele com nossas própria forças, pra diminuir a chance de dar errado. Não, não fui à Turquia, nem à Tailândia; optei por ficar e me sentir engaiolada.

Só à partir daí é que voltei a refletir sobre meu sonho de conhecer o mundo. O que tinha ficado adormecido tanto tempo acordou com força total quando a possibilidade daquela viagem surgiu, mas não voltou a dormir quando deu errado. Desde então me sinto sufocada, presa. Tenho a sensação de que o mundo está acontecendo e eu não estou fazendo parte dele! E nem precisa ir muito longe: nunca mais irei à Ilha Grande que sofreu um desastre natural. Quando eu for lá, será outra Ilha Grande, não aquela que eu queria em conhecer quando tinha 20 anos, muitos sonhos e pouquíssimo dinheiro no bolso.

Recebi um convite pra ir a Nova York em junho. Fiquei com medo de me empolgar. Ainda bem, porque mais uma vez não poderei ir. Mas agora estou com medo de ter medo de me empolgar. Porque se eu não me empolgar, aí é que nunca vou conseguir realizar meu sonho de viajar mesmo!

Cheguei à conclusão de que estou mesmo engaiolada quando pela primeira vez ouvi Hunter, da Dido. Não adianta ser rainha, se a rainha não pode sair do pedestal. Não tem graça nenhuma! Pior foi ver que eu estou me sentindo engaiolada com razão, eu estou numa gaiola. Mas a portinha está aberta e eu nem tinha visto... Posso sair quando quiser, mas estou tão acomodada no meu pedestal, dentro da gaiola, protegidíssima, que me esqueci que meus sonhos são realizáveis, que há tempo e que basta descer do trono, tirar o salto e sair pela porta que sempre esteve aberta.

Não, não deixei de amar meu marido. Mas isto não significa que eu não tenha sonhos que ele não compartilhe. E não precisamos nos separar pra eu poder realizar o sonho de viajar e conhecer o mundo. Acho que ele entendeu isto, está me apoiando a ir a Nova York, mesmo que seja por menos tempo do que eu gostaria, pra eu poder assistir O Fantasma da Ópera na Broadway. Estou realmente feliz que ele tenha compreendido minha necessidade de viajar, mesmo que esta viagem não vá rolar agora.

E eu vou viajar e muito ainda. Porque agora eu sei que a porta está aberta, que posso descer e subir do pedestal quantas e quantas vezes eu quiser. Eu vou viajar. Vou viajar porque preciso e voltar porque o amo.

Laeticia nunca pensou que fosse igual ao Pássaro Encantado. Mas pelo visto é.

2 comentários:

Carollinna disse...

Eu nunca sonhei com grandes viagens, aliás,meus sonhos sempre foram muito simples. Filhos eu sempre quis ter. E aí sonhei que meus filhos teriam sonhos diferentes dos meus e que os realizariam.Aos poucos, eles vão se realizando pra eles e consequentemente, pra mim. Não ando vendo você realizar plenamente seus sonhos,mas existem questões aí que só você pode avaliar. Mas por favor, não se acomode. "Voa e canta enquanto te sustentarem as asas".

Patrícia Gresta disse...

Ei! Passando por aqui e encontrando-me nos seus textos. Compartilho de tantos sentimentos que você descreveu nos seus posts... acho que são conflitos da nossa geração, sei lá!

Virei mais vezes aqui!

Bjo,

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