sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Telecine

Cheguei em casa morta de cansada. O trabalho havia sido duro, muita tensão, muita fofoca, muito olho gordo e eu precisava dar uma relaxada. Desabei no sofá antes mesmo da Laila ser capaz de abanar o rabo duas vezes e liguei a TV. Telecine light porque a novela ainda não tinha começado. Fiquei assistindo uma comedinha romântica na qual, após vários desencontros, tudo acabava bem. Peguei o filme pela metade, mas comédia romântica é comédia romântica, né? Dá pra pegar do meio pro fim. 

Antes do happy end, o celular tocou: era trabalho, mas trabalho que poderia com certeza esperar até o dia seguinte. Comentei que estava assistindo a uma comedinha romântica e ouvi: ah, não tem problema então, porque nestes filmes Meg Ryan todo mundo sofre, mas tudo acaba bem. 

Desliguei o celular e fiquei pensando na vida enquanto assistia minha comédia. Engraçado como nas comédias os desencontros da vida sempre ficam esclarecidos no final, né? Nos filmes de aventura também. O mocinho se dá bem, o mauzinho se dá mal, tudo acaba bem. Uma maravilha de maniqueísmo. Quem dera a vida fosse assim. Nos filmes todo mundo que se estrepa fez por merecer, aí a gente fica feliz quando esta galera se dá mal. 

Mas, e nós? Aliás, e eu? Porque eu já me estrepei algumas vezes nestes trinta e um anos, mas sinceramente, não vejo o que possa ter feito pra merecer me ferrar tanto! Evidentemente eu não me julgo a Madre Teresa de Calcutá, mas é muita desproporção. Será que querer uma vida melhor, mais confortável – coisa que eu, pobre mortal só conseguirei com trabalho, estudo e muita, muita sorte – é um pecado assim tão grande a ponto de eu merecer levar cano de uma sócia e perder até a crença na Justiça dos homens? Será que minha confiança, minha boa fé, me tornaram tão boba a ponto de eu merecer ser passada pra trás? 

Fico buscando estas respostas e obviamente nunca as encontrarei. Mas tenho muita resistência em acreditar que agir como eu gostaria que agissem comigo, que seguir aquele roteiro clássico “estudo-trabalho-sucessoprofissional-respeito-lealdade-amor-família”, que acreditar nas pessoas não me tornam merecedora de, no mínimo, poder manter alguns dos meus sonhos, das minhas ilusões. Fiquei pensando nos inúmeros desencontros pelos quais passei e me lembrando de que, não, nem sempre as coisas acabaram bem, nem sempre houve um happy end. E não adiantam palavras de consolo que dizem que nada acontece por acaso, que há um motivo pra tudo acontecer, que nós apenas não somos capazes de compreender. Quando as coisas não saem como nós planejamos, a despeito de todos os nossos esforços, de termos feito tudo direitinho, como manda o figurino, não há palavras que consolem. Não há sequer abraços que consolem. Há somente uma sensação de vazio, de perda de tempo, de perda de sonhos e ilusões. É claro que esta sensação passa. Pode demorar mais ou menos tempo, mas passa. Mas isto não faz o sentimento sumir. Não tira a frustração. Desliguei a TV e fui tomar um banho. Definitivamente, a vida não é uma comédia romântica. 

Laeticia tomou pau na última prova da USP e não sabe se vai tentar de novo e tem certeza que sua vida anda muito mais pra Telecine Cult do que pra Telecine Light.

 

Um comentário:

Sisa disse...

Bom, nós duas temos lados Telecine na vida (aliás, acredito que não só nós duas, todo mundo). Sua vida é mais ação, aquela que a pessoa precisa dar duas voadoras e três socos o tempo todo em quem chegar na frente, porque sempre tem mais imprevisto chegando. E você é meio Jack Bauer, se sente responsável por um monte de coisa quando cada segundo faz diferença pro resultado final. Minha vida é mais Meg Ryan (e vc sempre riu que eu adoro comédia romântica e adoro mais ainda se tiver Meg Ryan) porque sempre me identifico com a mocinha atrapalhada que passa o filme inteiro se ferrando - e todo mundo achando fofo - e na verdade não me falta esperança que meu final também seja clichê. Mas se todo filme tem final feliz, a gente nunca tem essa garantia. Mas tem outra: independente do que possa acontecer no filme que é nosso, independente dos desencontros que podem acontecer no caminho, a gente se ama. Então se não estiver dando certo, a gente sempre sabe que tem um colo pra deitar e chorar se for necessário. Mas não desanima não. Quem esforça pra ter final feliz acaba tendo meio feliz também. Beijo.

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