quarta-feira, 17 de março de 2010

A porta que bate

Das duas às cinco: oitenta e oito vezes a porta do escritório bateu.

Antes de chegar a contar tentei música clássica nos fones;

tentei concentrar mais;

tentei lembrar que é só uma porta.

Não deu.

Na primeira contagem lembrei do cartaz

“por favor não bata a porta”.

Eu mesma fiz, não autorizaram.

Não deu.

Na segunda contagem lembrei: foi proibido sentar na grama.

Na terceira que minha unimed é uma droga.

Na quarta que a comida é ruim.

Na quinta que o sindicato é pau mandado do patrão.

Então pensei que revistam os carros;

que revistam as bolsas;

que as britas acabam com meus saltos;

que engordei.

Daí eu lembrei que estou há milhas da civilização;

há muitos meses da pós-graduação.

Não quero saber de prestação.

Nem a pau encaro pedreiro e construção.

Pensei nos amigos ao longe.

No tempo em que tinha sonhos.

No tempo em que tinha tempo.

Na porta que bateu outra vez.

Não deu.

Não dá mais.



Gisele Lins escreve aqui às quartas-feiras. Esteve preste a surtar, mas nada como um bom psiquiatra e uma boa manicure nesta vida. Esta semana ouviu que “não punir os maus ofende os bons” e não pára de pensar em “e quando os bons é que são punidos?”.

2 comentários:

Renata disse...

Bah, guria! Desce a porta abaixo no pontapé!!!!!

Hehehe!
Beijos!

Força na peruca!

Lila disse...

Assim fico ainda mais aflita pra conversar com voce...
Beijo!

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