“Faça um estudo comparativo do Funcionalismo de Durkheim, Merton e Luhmann”.
E foi assim, com este enunciado, que tornou-se moribundo meu sonho de fazer mestrado na USP. Um ano de preparação e de estudo para chegar na hora H e a ansiedade jogar tudo por terra. Quarenta minutos para conseguir elaborar uma linha de raciocínio minimamente coerente e somente uma hora pra discorrer sobre um assunto que já foi objeto de tratados e mais tratados. Quer dizer, como comparar, em escassas quatro laudas um tema polêmico sob o ponto de vista de um filósofo, um jurista e um sociólogo?!!
“O resultado desta etapa será a média das duas provas que cada um de vocês já fez e desta, sendo que os dez melhores resultados serão convocados para uma outra etapa.”
Mexeu o moribundo. Ora, a prova de inglês eu fechei e na prova técnica tirei 89. Tudo bem, tudo bem, eu poderia ter tirado mais, mas, minhas amigas, participar de um processo seletivo da Faculdade de Direito da USP por si só já é um fator de ansiedade a mais. Haja coração, além de estudo. Enfim, se eu conseguir tirar uma nota sofrível nesta etapa de ontem, quem sabe não consigo pelo menos passar pra próxima?
“E Minas, Laeticia, como é que estão as coisas por lá?”
“Está tudo indo bem, professor, parei de advogar, só ajudo o Dr. Fulano com os clientes dele, mas não assino mais nada. Definitivamente, operar o Direito exige um estômago que eu não tenho.”
“E a prova?”
“Minha prova não está boa, professor... apesar do meu estudo. Fui a Luhmann e Merton, mas Durkheim eu simplesmente não consegui elaborar...”
“Eu vou ler aqui, mas fique tranqüila.”
Alguém aí pode me dizer como é que se fica tranqüilo depois de praticamente assassinar um sonho?!! Como é que se dorme bem depois de estudar horrores e às vésperas da prova a vida te surpreender com circunstâncias que simplesmente te impedem de raciocinar como de costume e pelas quais você nunca esperaria passar?
Odeio quando me dizem pra ficar tranqüila nestas horas. Eu não quero ficar tranqüila. Quero mitigar minha ansiedade, conferir o site quinze vezes por hora, até sair o resultado e eu poder relaxar, independentemente de sucesso ou fracasso. O estado de cansaço em que estou fez com que o resultado em si perdesse um pouco da sua importância. O que eu quero é saber no que vai dar. Porque aí vai estar acabado e não haverá mais ansiedade, mais preocupação, mais sofrimento. Pode até ser que comece tudo de novo no ano que vem, ainda não me decidi, prefiro esperar o resultado pra pensar sobre ele depois, mas pelo menos terei um tempo de descanso.
Tudo que ando querendo é deitar cedo, acordar tarde, tomar café da manhã sem pressa, parar de olhar o relógio, de conferir e mails, de carregar o celular a tira colo. Mas não consigo. Simplesmente não consigo.
Como não consigo parar de pensar um minuto sequer que o moribundo mexeu. Eu achava que ele tinha morrido, meu sonho de fazer mestrado no Largo de São Francisco, mas ele mexeu. E agora eu me pego na esperança de que o moribundo abra os olhos, profira algumas palavras e fique novamente de pé. E ao mesmo tempo tenho medo. Tenho medo de que ele nunca mais se mexa. Pior, tenho medo de que ele abra os olhos, fale, se levante e depois caia de novo. Desta vez definitivamente.
Neste exato momento estou em vigília. Meu moribundo não me deixa dormir, não me dá descanso. Sinto meus músculos das costas se contraírem, chego quase a sentir dor. Tento me controlar. É difícil, mas estou conseguindo. O moribundo não pára, balbucia alguma coisa e eu me assusto. Não, penso eu, ele só se mexeu um pouco, ainda não consegue balbuciar nada. Acho que o cansaço está me vencendo. Vou me entregar. Mesmo que eu queira lutar por este moribundo, acho que agora já não é o melhor momento. Preciso recarregar as baterias. Nem que seja para sofrer menos no velório e no enterro de um sonho que agora está moribundo.
Laeticia está muito, muito cansada. Estudou seriamente pra esta prova, pois sabia que não seria fácil. Só não contava com baterias fracas justamente neste momento. Mas segue acreditando que o moribundo pode sair desta.
Terá sido tão de repente assim? Desaceleramos muito com a proximidade dos 40. Aprendemos a caminhar apreciando o caminho ao invés de correr loucamente para chegar sabe-se lá onde. Descobrimos que todas queremos chegar lá, e que o lá de cada uma é diferente. Aprendemos a olhar de dentro para fora. Muita coisa aconteceu nesta década. Crianças nasceram, animais de estimação se foram, relações se fortaleceram, outras, desvaneceram. Aprendemos muito. Principalmente que dividir só nos faz melhores.
2 comentários:
Oi Laeticia!
Quanta tensão... a ansiedade mata qualquer um...
Mas não se cobre tanto. Você fez o que estava a seu alcance, agora é esperar para colher os frutos. E torcer pelo que seja melhor para você.
Bjs,
Dani
Oi Laeticia!
Estamos torcendo por você garota! Conta pra gente como foi depois...
Um abração! Gi
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