terça-feira, 11 de setembro de 2007

E o Rio de Janeiro Continua Lindo?

Joaquim Barbosa, ministro do Supremo Tribunal Federal, foi ovacionado pela população carioca no sábado pela manhã em conhecido barzinho da Zona Sul do Rio de Janeiro. Paradoxo com a cena que presenciei naquele mesmo “point” na sexta feira anterior, verdadeira vergonha para o berço da democracia, o Rio de Janeiro que viu filhos seus morrerem torturados pelo direito de manifestar-se livremente.

Era um bar, com mesas na calçada, às três da tarde de um feriado nacional. Uma bagunça só: várias mesas quase coladas, garçons desesperados para atender clientes igualmente desesperados por um chope gelado. Finalmente conseguimos uma mesa, não sem antes ter uma pequena querela com o próprio garçom, que tentou evitar a todo custo que minha amiga com criança no colo ocupasse uma mesa onde poderiam sentar beberrões que renderiam boas gorjetas. Várias pessoas reclamavam do atendimento que acontecia aos trancos e barrancos. Diante de tamanho caos, só o bom humor tornava suportável o ambiente. E eu estava ali só porque justamente aquela amiga queria ficar.

No meio da baderna instalada, identificamos um sotaque nordestino que vim a saber ser originário especificamente do Recife. Papo vai, papo vem, e já éramos todos amigos de longa data, cada qual na sua mesa, mas nos divertindo juntos.

Quando penso que não, surge do nada um senhor de cabelos brancos esbravejando em direção à mesa “nordestina”, colocando o dedo praticamente na cara de um rapaz e dizendo que ali era um lugar de respeito, que o rapaz fizesse silêncio, que ele era síndico do prédio, etc etc etc!! Uai, mas ali não era um bar, na rua, local público, três da tarde de um feriado? Será que o avermelhado senhor havia tido o bom senso de pedir ao rapaz que baixasse um pouco o volume da “sirene” que ele imitava de brincadeira, já que estava tão incomodado? Será que o senhor tão incomodado não pensou em ir embora pra casa, onde, ali sim, poderia fazer exigências? A impressão que tive é que o tal senhor poderia muito bem ter sido um dos responsáveis pelo desaparecimento de estudantes que lutaram pela democracia durante o regime militar, tamanha falta de argumento e autoritarismo.

Civilizadamente, mas não sem demonstrar indignação, a “banca nordestina” pediu a conta e, ao se levantar da mesa, aconteceu o absurdo maior: grande parte das pessoas que ali se encontrava, a nata da “high society” carioca, aplaudiu a saída daqueles turistas, mandando-os embora e deixando bastante claro que ali eles não eram bem vindos.

Pedi a conta e fui embora também. Fiquei tentando adivinhar o que teria feito aquelas pessoas se acharem no direito de expulsar turistas de um local público. Não consegui. Ora, o Rio de Janeiro não vive justamente do turismo? Ou os cariocas pensam que o petróleo – que vem principalmente da Baía de Campos, e não da cidade do Rio – vai durar pra sempre? Será que o povo dali pensa que bastam as belezas naturais para atrair as pessoas? Tenho minhas dúvidas. Que a cidade do Rio de Janeiro é maravilhosa, acho que ninguém duvida. Só duvida quem ainda não foi lá. Aquele mar, aquelas pedras, o Corcovado, os Dois Irmãos, a Lapa com seu samba de primeiríssima qualidade são realmente uma maravilha. Mas se a atitude das pessoas não mudar, será que o Rio de Janeiro continua mesmo lindo?


Laeticia é uma mulher de trinta que se indigna com falta de educação. Durante o feriado, teve mais motivos para se indignar com o Rio de Janeiro, mas prefere acreditar que a maioria dos cariocas é gente boa e vai sempre receber seus turistas de braços abertos, como o Cristo Redentor.


8 comentários:

Anônimo disse...

Laetícia, adorei o texto, realmente somente uma pessoa de "fora do "núcleo" do incidente poderia narrar a situação de forma tão vívida.
Muito bom!
Continue assim.
Abraços de todos que fizeram parte da "banca nordestina".

Anônimo disse...

Laeticia, não precisamos nem comentar mais nada...como disse Fabiano, você narrou da forma que sentimos, uma total interrogação por não conseguir entender, até hoje, o motivo de alguns senhores ,de elevada idade, irem para um bar e quererem silêncio...enfim, o Rio é lindo e tem gente boa sim, mas acredito que os cariocas deveriam tentar resolver as coisas com mais conversa, com o famoso "papo" que eles dizem ter e não chegando em pessoas, sem saber o que está acontecendo e gritando, como se fossem os donos do lugar...o Rio vive de turismo e nós deixamos boas notas naquele e em outros lugares e é isso que faz com que a cidade seja tão maravilhosa e diversificada, portanto os turistas, eles sim, deveriam ser ovacionados no Rio e tratados com todo o respeito que merecem.

Abraços,
Marina Lima (Nordestina sim "sinhô", Pernambucana e recifense com muito orgulho!!)

Paula disse...

Infelizmente a intransigência das pessoas está se tornando incontrolável! Acho que o direito de um acaba onde começa o do outro, mas não visualizei invasão de zona de direitos no fato narrado...
O que mais me deixou boquiaberta não foi o senhor estressado, mas sim a reação das demais pessoas que estavam no bar, com o mesmo intuito das pessoas destratadas... Absurdo!
Tenho minhas dúvidas se o Rio de Janeiro continua tão lindo, porque quem faz o lugar, por mais que a geografia ajude, são as pessoas que ali habitam.

Professora Vanessa disse...

Nossa, Laeticia,
fiquei horrorizada com o que você escreveu. Como podem as pessoas agirem dessa maneira... O Rio pode continuar lindo, mas certas coisas são mais importantes, e a receptividade é fundamental quando se trata de turismo.
Bjs!

Andrea disse...

Laeticia,

Eu conheci o Rio como turista. E não gostei. Talvez porque tenha ido com olhos muito críticos, e também por não ter sido bem recebida como turista. Achei que faltou gentileza e cordialidade nos lugares onde fomos atendidos.

Pra mim, o Rio continua lindo, desde que visto "do alto e de longe...". De perto, eu acho aquele lugar horroroso.

P.S.: eu sei que sou uma voz dissonante. Pra maioria, o Rio continua lindo...

Angel disse...

Maria, os aplausos são seus. A narração é perfeita. Triste é sentir vergonha do comportamento de um semelhante. Semelhante? Não, não somos semelhantes a essas pessoas que se comportaram de forma tão nojenta! Recifenses, perdoem, eles não sabem o que dizem e fazem.
Angel

Unknown disse...

Faço minhas as palavras da Angel.
Triste é sentir vergonha pelos outros.
Eu sinto vergonha pelos que se portam como donos do mundo...
Sinto vergonha do ser humano que se acha melhor do que o outro.
Sinto vergonha até das pessoas que se calam e aceitam!

Sisa disse...

Quando eu achei que a parte horrorosa era o senhor se enchendo de razão, leio a parte dos aplausos. Meu Deus. Tô chocada.

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