sábado, 13 de outubro de 2007

Os meus piás

Inevitável não pensar neles no dia de hoje. Os piás da minha vida.

Fui a última filha, a última neta, a última criança de uma geração na minha pequena família, e durante muito tempo fiquei mal acostumada (na minha visão bem acostumada) com isso. Não que eu tenha sido uma guria mimada, pelo contrário. Sempre fui geniosa demais para que a idéia de “ganhar” alguma coisa com um beicinho ou uma birra me agradasse. Mas confesso que, de alguma forma, o tratamento de um caçula pela família é diferente.

Eu senti isso há quatorze anos atrás, quando eu tinha quatorze anos, o tempo que durou o meu reinado. Foi quando veio minha sobrinha, a primeira criança da minha vida, e o meu mundo mudou. Deixei de ser a caçula. No início foi estranho, e um tanto aterrorizante, deixar de ser o centro das atenções da mamã, da vovó, da minha própria irmã, que sempre me protegeu, mas que andava “meio ocupada” então. Porém, na primeira vez que aquela coisinha, que eu achava que era filha do padeiro ou tinha sido trocada na maternidade (ta que meu cunhado era bem clarinho, até, mas como nasceu um serzinho tão branco, loiro e de olhos azuis no seio de uma família com dois pés na África?), olhou de verdade bem dentro dos meus olhos, ela me conquistou eternamente. Ainda mais quando “imitou o índio” pela primeira vez, sob minha súplica. Ou quando dizia “baia Didi, baia” (pedindo bala). Ou quando, por iniciativa própria, começou a imitar os miados das gatas no cio na redondeza, nos fazendo rolar de rir. Nós nos vemos pouco hoje em dia, e ela vai fazer quinze anos.

O tempo passou tão rápido e as vezes que eu pude estar com ela foram infinitamente menos do que eu gostaria. Porém, em todas estas vezes eu fui grata, por ver na caçula que me substituiu uma guria tão amorosa, que cumpre o mesmo papel que eu nesta família, o de trazer um pouco de riso, se colo, de leveza. Uma guriazinha já com ares de batalhadora, como a mãe, sonhadora, como a tia, e que acredita muito nos seus sonhos, como todas as mulheres da minha família.

Quatorze anos se passaram e, neste ano, eu ganhei dois presentes, que como minha sobrinha foram os maiores que eu já tive: dois afilhados! O filho do meu irmão e a filha da minha melhor amiga. Por eles passei a ter certeza de que este mundo se preparando para ser um lugar melhor. A forma como eles me olham é única, ainda mais para seres tão pequenos. Seus sorrisos (e agora gargalhadas) tão precoces, fazem o tempo parar num instante em que não apenas desconfiamos, mas é impossível não ter certeza de que algo muito grande cuida da gente. Como minha sobrinha, eles também moram fisicamente longe de mim, o que não diminui minha ligação e amor por eles, mas é o que me faz ter certeza dos motivos que terá o inventor do tele-transporte (quem sabe se ele não será eu mesma?)

São nestas quatro crianças que eu penso hoje: as três que eu já falei e a minha própria, que nunca cresceu, e que anda ao meu lado todos os dias, esperando uma brecha para se manifestar e me mostrar que ainda dá pra sonhar, pra fazer faz-de-conta, pra ver o mundo como se fosse a primeira vez, e gostar muito dele. Esta galerinha me faz pensar também em uma quinta, que há muito tempo eu tenho certeza de que vou conhecer por aí e simplesmente pegar para mim, fazendo-a um filho.

As crianças da minha vida. Há algum tempo eram muito poucas, mas as coisas estão mudando, o colorido que apenas uma trazia para minha vida está aumentando e eu confesso que estou adorando isso.


Gisele Lins no dia das crianças, longe, mas muito perto de todos os piás que ama, escreve aqui aos sábados.



6 comentários:

Angel disse...

Crianças tem sempre um olhar diferente, meigo, conquistador. Tenho duas por perto e até quando estão de "beicinho" são fofas, tem uma chorando aqui nesse instante. Espero saber mostrar a elas o melhor caminho para transformar positivamente o mundo.
Bjos

Paula disse...

Gostei Gisele!
Criança é realmente o que faz a vida ter sentido! Eu tenho apenas um sobrinho, que acabou de fazer nove anos, mas me lembro como se fosse hoje o dia em que ele nasceu!
Ele é meu xodó e faço loucuras pelo danadinho!
Concordo com você em um ponto, mais que nos outros: perceber o colorido único que uma criança pinta em nossas vidas só é possível se o nosso "eu" criança ainda existir!
Beijos.

Unknown disse...

Ai que texto lindo Gi...
me deu saudades das crianças da minha vida...

Sisa disse...

Oi Gi,
eu não tenho muitas crianças da minha vida. Uma das que eu tinha, meu irmão, outro dia me lembrou que já não é criança mais (é... ano que vem ele já pode votar...). Mas tem duas que, sem querer despertar ciúmes de ninguém, ocupam um espaço na minha cabeça que chega a me surpreender: a Paspatinha de Vanessa e a neném de Liz, que vai nascer em dezembro. Sou tia corujona MESMO das duas, embora meu jeito meio "criança não gosta de mim" nem sempre deixe isso claro. Quem sabe quando elas crescerem elas entendam que meu jeito meio sem jeito não é falta de amor, seja de longe ou de perto?

Professora Vanessa disse...

Texto mais lindo!
Um abraço especial para a criança que nunca cresceu!
Vanessa.

Lila disse...

Orgulhosa demais por ser a mae de um dos teus pias, agradeco pelo amor que tens pela minha filha.
Te amamos dinda,
Bjs Lila e Isa

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